Os livros “1808”, “1822” e “1889”, do jornalista, escritor e historiador Laurentino Gomes, têm como cenário principal o centro histórico da cidade do Rio de Janeiro. A região mais antiga da capital fluminense, outrora o Distrito Federal, é pontuada por ruas, largos, monumentos e edificações que revelam a ascensão do Primeiro Império e a queda do Segundo Império, porém desconhecidos da maioria dos turistas que visitam a cidade.

É ali no centro do Rio Antigo que se descortinou a história da família real desde a fuga para o Brasil até a Independência. São locais como o Paço Imperial, a rua do Ouvidor, a Ilha Fiscal, o Cais do Valongo, o Campo de Santana, o largo da Carioca, a praça XV e vários outros que testemunharam a agem de personagens como dom João VI, Carlota Joaquina, dom Pedro I e dom Pedro II, princesa Leopoldina, marquesa de Santos e José Bonifácio de Andrade Silva.  

Afoxé Filhos de Gandhy durante lavagem das escadarias do Cais no Valongo, na zona portuária do Rio de Janeiro.

Na quinta-feira (25/11), uma parte dessa história foi reescrita com a entrega das obras de revitalização do Cais do Valongo, na região chamada “Pequena África”, que inclui a praça Mauá e os bairros da Saúde e da Gamboa, onde está a Pedra do Sal, berço do samba. O Cais tem suma importância histórica: no local desembarcaram milhares de africanos escravizados entre final do século XVIII e o início do século XIX para serem comercializados.

Entre os equipamentos do Cais do Valongo havia o Lazareto, hospital de quarentena para escravizados doentes, as casas de engorda, os armazéns e o Cemitério dos Pretos Novos.  Redescoberto em 2011, durante as escavações na zona portuária, e alçado a Patrimônio Mundial da Unesco em 2017, o Cais verá o Armazém das Docas Dom Pedro II (1871) ser transformado em um centro de memória sobre a história e a cultura negras no país. 

A Ilha Fiscal, onde aconteceu o Último Baile do Império
  
ear por essa região é vasculhar a história do Brasil. “Para ‘1889’, o Rio é cenário principal. Aqui se deram os principais fatos para a derrubada da monarquia brasileira”, destacou Laurentino Gomes em entrevista à revista “Veja”. Depois de escrever os livros, ele reconhece que já conhecia a cidade, vinha sempre a trabalho como jornalista. “Impressionante como hoje eu vejo o Rio de uma maneira completamente diferente”.

A visita pode ar pela Ilha Fiscal (foto acima), que o visitante visualiza da janela na descida no aeroporto Santos Dumont. Hoje, a edificação abriga o Espaço Cultural da Marinha (ECM), com exposições temporárias. O local foi cenário do Último Baile do Império, realizado dias antes da Proclamação da República. Os ingressos custam R$ 36 (inteira) e R$ 18 (meia). 


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O Campo de Santana, atual praça da República, com suas grutas, fontes e esculturas de Paul Jean-Baptiste Gasq e Gustave Frédéric Michel (1906), foi palco de momentos marcantes da história do país, como a aclamação do imperador Pedro I, a Proclamação da República (a casa de Deodoro da Fonseca ficava em frente) e os protestos da Revolta da Vacina.

Descobrir o Rio não das praias nem dos cartões-postais, mas por seus componentes históricos, se torna algo muito interessante quando se visita principalmente a Biblioteca Nacional, onde ainda se encontram os 50 mil livros trazidos de Portugal, ou o Paço Imperial, a primeira casa de dom João VI no Brasil, um dos palacetes mais antigos do Brasil. 

O paço Imperial, na Praça XV, residência oficial de Dom João VI e centro de poder do reinado até 1822

Com estilo barroco, o Paço Imperial (foto acima) foi construído entre 1738 e 1743. Com a chegada da família real, em 1808, tornou-se residência oficial e centro de poder do reinado até 1822. O local foi palco de eventos históricos, como o Dia do Fico (1822), quando dom Pedro I declarou ao povo a sua intenção de ficar no Brasil, e a da Lei Áurea (1888).

Para uma caminhada no centro, indispensável ainda é visitar a Antiga Sé, hoje a imponente e belíssima igreja de Nossa Senhora do Carmo, restaurada em 2008, onde dom João VI e dom Pedro foram aclamados e coroados, e o Convento de Santo Antônio, perto do largo da Carioca, onde foi escrito e discutido o abaixo-assinado do Dia do Fico, em 1821.  

O Museu Nacional de Belas Artes tem a maior coleção de arte brasileira do século XIX

Pelos caminhos do centro histórico tem ainda centros culturais (CCBB, Correios, Casa França-Brasil), museus (de Arte Moderna/MAR, do Amanhã, Nacional de Belas-Artes, da História e Cultura Afro-Brasileira), igrejas e conventos (Candelária, São Francisco da Penitência, Ordem Terceira de Nossa Senhora do Carmo), prédios públicos (Palácio Tiradentes) e o imponente Theatro Municipal, inspirado na Ópera de Paris e que oferece visitas guiadas. 

Não há como ar despercebido por um dos monumentos mais belos do Rio de Janeiro, o Mosteiro de São Bento, no alto do morro homônimo, no centro, próximo à área portuária. Um dos principais monumentos da arquitetura colonial do país está aberto diariamente das 6h30 às 18h30 e tem missas celebradas com cantos gregorianos todos os domingos. 

A rosácea marca a entrada da igreja de São Bento no mosteiro  

Concluída na segunda metade do século XVII, a igreja é uma das poucas construções do período colonial no Rio de Janeiro ainda de pé e belamente preservada. A arquitetura reúne detalhes dos estilos barroco e rococó, com todo o interior coberto por talha de madeira dourada. O monumento ainda tem azulejos portugueses e abriga um acervo de arte rico e valioso.

Uma boa maneira de mergulhar na alma do Rio de Janeiro do fim do século XIX não é apenas ler Laurentino Gomes. Os livros do escritor Machado de Assis são outro bom caminho. O Rio de Janeiro do centro histórico é uma grande aula de história. Sem contar que você pode terminar o dia na Confeitaria Colombo (1894), fazendo uma viagem na belle époque e degustando salgados, como o biscoito artesanal, e doces, como a marmelada. 


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A casa foi frequentada por Machado de Assis, pela cantora Chiquinha Gonzaga, pelo magnata da comunicação Assis Chateaubriand, pelo poeta Olavo Bilac, pelo presidente Getúlio Vargas e pelo maestro Villa-Lobos, só para citar alguns, e por nomes icônicos, como os escritores James Joyce e Ernest Hemingway, o casal Jean-Paul Sartre e Simone de Beauvoir e o dramaturgo Bertold Brecht.

A decoração em art nouveau – composta por espelhos de cristal da Antuérpia, cadeiras de jacarandá e palhinha assinados por Antônio Borsoi e mesas com pés de ferro e tampo de opalina azul, tudo trazido da França, além da belíssima claraboia – revela um Rio de Janeiro bem diferente do que é hoje, com segurança, glamour e sofisticação de outrora. 

Receptivos oferecem eios ao Rio histórico, entre eles Intertouring e Natripp. Segundo Luna Muniz, gerente de reservas e sistemas da Intertouring, os eios são procurados geralmente por turistas internacionais ou do Sul do país, que gostam de conhecer a história da cidade. Eles duram cerca de quatro horas e devem ser reservados com antecedência. 

O Museu do Amanhã, no Boulevard Olímpico, está nos roteiros de quem visita o centro histórico

Na Intertouring, o tour guiado “Rio Histórico com eio de VLT” acontece pela manhã e visita Candelária, Theatro Municipal, Biblioteca Nacional, Cinelândia, Mosteiro de São Bento (nos domingos tem missa com canto gregoriano), CCBB e boulevard olímpico. É feito em VLT (Veículo Leve sobre Trilhos), herança dos Jogos Olímpios, e custa R$ 216 por pessoa.  

A Nattrip tem apenas uma opção interessante de caminhada pelo centro histórico. Ao custo de R$ 260 por pessoa, começa no Paço Imperial e a pelo Arco dos Teles, Centro Cultural dos Correios, Casa França-Brasil, CCBB, Candelária, Mosteiro de São Bento, avenida Rio Branco, Confeitaria Colombo, Cinelândia, Theatro Municipal, Museu de Belas-Artes, Biblioteca Nacional, Palácio Pedro Ernesto e finaliza nos Arcos da Lapa e Escadaria Selarón. 

 

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