O ministro Alexandre de Moraes preside o interrogatório dos réus do "núcleo crucial" da trama golpista no Supremo Tribunal Federal (STF), que se estende até a próxima sexta-feira (13 de junho). O primeiro dia de sessão no plenário da Primeira Turma, com a presença do ex-presidente Jair Bolsonaro, durou seis horas, nessa segunda-feira (9) das 14h às 20h.

Durante o período de audiência, o ministro Alexandre de Moraes, relator da ação penal do golpe, interrogou o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, Mauro Cid, e o ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) Alexandre Ramagem sobre as acusações de participação na trama.

Os depoimentos foram marcados por momentos de descontração protagonizados por Moraes, que provocaram risos dos presentes, incluindo do próprio Bolsonaro. Os réus permaneceram "isolados" uns dos outros durante toda a audiência, podendo se comunicar apenas com seus respectivos advogados.

O que disse Mauro Cid

Ex-ajudante de Bolsonaro, Mauro Cid, que firmou acordo de colaboração premiada, foi ouvido antes dos demais acusados. Durante seu depoimento, Cid revelou que Bolsonaro havia se reunido com o auxiliar Filipe Martins para modificar a minuta golpista e "enxugou o documento, retirando a prisão de autoridades".

Cid também confirmou que esteve presente em uma reunião na qual foi apresentado ao ex-presidente um documento que previa a decretação de medidas de estado de sítio e prisão dos ministros do STF. Além disso, ele afirmou ter recebido dinheiro do general Braga Netto, em uma sacola de vinho, para que fosse reado ao major do Exército Rafael de Oliveira, integrante dos kids-pretos, esquadrão de elite da força.

O que disse Ramagem

Já o ex-diretor da Abin, Alexandre Ramagem, negou ter usado o órgão para monitorar ilegalmente a rotina de ministros do STF e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) durante o governo de Bolsonaro. Ele também negou que a Abin e a ferramenta FirstMile eram usados visando a proteção e a resolver problemas particulares do então presidente, seus filhos e sua família, e descartou a existência de uma "Abin paralela".

Alexandre Ramagem também declarou que documentos encontrados em seu computador pessoal com questionamentos sobre as urnas eletrônicas não foram divulgados.

Bastidores do julgamento

A sessão teve apenas um intervalo de 15 minutos, concedido por Moraes por volta das 17h, após três horas ininterruptas de interrogatório. Não foi permitida a entrada de alimentos no plenário para réus, advogados ou jornalistas, sendo disponibilizada apenas uma mesa com café e água na entrada, com xícaras e copos de vidro substituídos por objetos de papel.

O ex-presidente Bolsonaro demonstrou ansiedade antes do início da audiência. Ele chegou cedo ao tribunal e permaneceu inicialmente no banheiro do gabinete da Primeira Turma assistindo a vídeos. Durante o interrogatório, fez diversas anotações e consumiu café pelo menos duas vezes.

A audiência aconteceu no anexo 2B do STF, conhecido informalmente como "igrejinha" devido ao seu formato. O Supremo implementou medidas rigorosas de segurança, incluindo detectores de metal e aparelhos de raio X nas entradas dos prédios, além de equipamentos extras em frente ao elevador no subsolo e na porta do plenário.

Entre os ministros da Primeira Turma, apenas Luiz Fux acompanhou presencialmente a sessão, permanecendo até o final e fazendo anotações durante a maior parte do tempo. Cármen Lúcia, Cristiano Zanin e Flávio Dino não estiveram presentes.

Um dos momentos mais descontraídos ocorreu quando Cid disse a Moraes: "Somente o senhor ficaria preso", referindo-se ao plano golpista. Em resposta, o ministro respondeu: "O resto conseguiria um habeas corpus", provocando risos, inclusive de Bolsonaro.

Em outro momento, após a defesa de Bolsonaro reproduzir áudio de mensagem de Cid sobre reuniões do então presidente com empresários bolsonaristas, Moraes perguntou ao advogado Celso Vilardi se ele desejava "aditar a denúncia" para incluir os empresários mencionados.

Ao final da sessão, quando o advogado do general Heleno solicitou que a audiência de hoje começasse após as 9h para que ele pudesse "minimamente poder jantar", Moraes concordou, estabelecendo o horário para "às 9h02", o que também gerou risos entre os presentes.

Até a próxima sexta-feira (13), Alexandre de Moraes vai interrogar presencialmente o ex-presidente Jair Bolsonaro e todos os réus acusados de participarem do "núcleo crucial" de uma trama para impedir a posse do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva após o resultado das eleições de 2022.

Confira a ordem dos depoimentos

Os réus respondem pelos crimes de organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, dano qualificado pela violência e grave ameaça e deterioração de patrimônio tombado.

O interrogatório dos réus é uma das últimas fases da ação penal. A expectativa é de que o julgamento que vai decidir pela condenação ou absolvição do ex-presidente e dos demais réus ocorra no segundo semestre deste ano. Em caso de condenação, as penas am de 30 anos de prisão.