A Bienal do Livro nunca usou tanto a comparação com o Rock in Rio para explicar seus planos quanto este ano. O motivo é tão simples quanto vistoso. Pela primeira vez, o evento literário que acontece no Rio de Janeiro desta sexta, 13, até dia 22 de junho, terá uma roda-gigante em meio a seus pavilhões, bem ao estilo do brinquedo que, na última edição do festival de música, era agem obrigatória entre os palcos Mundo e Sunset.

Se você acha estranho começar a falar de um evento literário, cujo primeiro e último objetivo é promover a leitura, por uma embocadura como essa, entenda como um sinal de que o evento dobra a aposta no entretenimento e não vê problemas nisso. E reconhece como bem-vindas as eventuais contradições.

"O que fazemos é pôr o livro no centro e esticar o olhar do leitor para outras plataformas", aponta a jornalista e pedagoga Carolina Sanches, já em sua quarta edição seguida como curadora da Bienal, sobre o conceito de "leitura elástica" que norteia o evento.

"Pode ser que o leitor vá numa cabine da roda-gigante, veja ali uma referência a um livro que ele nem conhece e saia com vontade de ler. Ou entre no 'escape room' do Raphael Montes ou da Agatha Christie e saia falando, caramba, agora quero conhecer Sherlock Holmes", diz, em referência a outra das novas atrações.

Sanches é uma das responsáveis pelo espaço infantil da Bienal e pelo novo "Curto Circuito", área estreante e voltada a pré-adolescentes com autores pop. A programação de 2025 também convida os leitores a labirintos, atividades imersivas e experiências interativas.

Não havia uma conversa com alguém por trás desta edição da Bienal que não celebrasse o ineditismo do conceito de "book park" proposto para o megaevento - sempre falado assim, em inglês. E que não sublinhasse seus números superlativos.

"Começamos a desenvolver em 2023 um projeto que era para ser feito em três bienais. Nós chegaríamos só em 2027 ao que vai ser esta Bienal em termos de atração, de 'book park', de ativação", diz Tatiana Zaccaro, diretora da GL Events, responsável pelo evento carioca. "Com o Rio como Capital Mundial do Livro, ganhamos força e coragem para fazer quatro anos em dois."

Haverá recorde de área ocupada no Riocentro - subiu de 90 mil para 130 mil metros quadrados, deixando também mais espaço para alimentação ao ar livre - e de estandes de marcas expositoras - serão em torno de 570, incluindo novas iniciativas como o Compiladas, que reúne 20 editoras independentes de diversas regiões do país.

E a Bienal prevê bater também recorde de público? "Estamos preparados para isso, em termos de infraestrutura, mas não temos esse desejo", afirma Zaccaro.

A diretora diz que o número de 600 mil visitantes alcançados pela edição ada já é "muito incrível" e o aumento de espaço servirá para receber essas pessoas com mais conforto. Aponta, contudo, que a compra de ingressos está "mais aquecida" que da última vez.

Parte disso se deve também à maior atração de um evento como esse —os autores, que se equilibram entre estrelas pop como a americana Lynn Painter, o coreano Kim Ho-yeon e os brasileiros Raphael Montes e Elayne Baeta e autores premiados como a nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie, que fará a abertura da Bienal ao lado da atriz Taís Araujo.

Um convidado que resume bem a proposta da Bienal de 2025 é G.T. Karber, americano de 38 anos que explodiu com a série best-seller "Murdle", que mistura histórias de suspense com desafios de lógica à la Coquetel.

"Não é um livro que o faz sentar quieto e ficar focado, mas um livro ativo, que engaja você em mistérios curtos, do tamanho de uma mordida", sintetiza ele sobre seu projeto. "Eu espero que, em vez de levar leitores para longe dos livros tradicionais, 'Murdle' traga para perto dos livros, pessoas que de outra forma talvez estivessem jogando nos seus celulares."

Karber diz que ele mesmo é "facilmente distraível" e precisa deixar o telefone numa sala bem longe para conseguir se concentrar - um problema que tem se tornado comum nas gerações mais jovens. "Então esse é o tipo de livro perfeito para mim, só pede pedaços pequenos de atenção e os recompensa."

Para a noite do segundo sábado de Bienal, o autor prepara uma experiência de jogo coletivo em torno de "Murdle", desenhado especialmente para a plateia carioca. "A minha maior esperança é que vá ajudar pessoas a exercitarem seus músculos de leitura, digamos assim."

É um discurso afinado com o de Sanches, a porta-voz da Bienal que defende ampliar e renovar as maneiras como se atraem pessoas aos livros. Nas palavras dela, é urgente "atualizar a percepção de como se formam os leitores hoje".

"A gente precisa apertar o F5 dos projetos de leitura", aponta. Segundo ela, preciso que os festivais literários se adaptem, sim, para os leitores da nova geração - mas também as escolas, as bibliotecas, os mediadores de leitura. "E isso é um vespeiro, porque as pessoas têm muita resistência. É uma área muito conservadora."

A crise escancarada pela pesquisa Retratos da Leitura, que mostrou uma maioria inédita de "não leitores" no Brasil, deu lastro a um problema já percebido por quem trabalha na área há muito tempo. "A questão é que agora está todo mundo olhando para isso", diz Sanches, sorrindo entre o alívio e a exaustão.