Quatro anos depois de ter tido a viabilidade contestada pelo Conselho Municipal de Desenvolvimento do Meio Ambiente (Codema), por possível impacto em mananciais, a exploração de uma jazida de minério de ferro do Serro volta ao centro das discussões na cidade, da região Central de Minas Gerais. Os trâmites que levariam à implantação do projeto da Herculano Mineração foram barrados na Justiça, na última segunda-feira. E, nessa quarta-feira (16), cerca de 150 pessoas manifestaram contra o empreendimento na porta da prefeitura local.

A juíza da comarca do Serro, Caroline Rodrigues de Queiroz, exige que o Codema não defina sobre a declaração de conformidade de empreendimento até que a empresa comprove que, de fato, adquiriu os direitos minerários da Anglo American. A magistrada pede ainda que a comunidade quilombola de Queimadas, que vive nas proximidades de onde será a lavra de exploração, seja ouvida no processo, já que sofrerá impactos. Cabe recurso da decisão, que é em caráter liminar.

A Justiça foi provocada por meio de um mandado de segurança coletivo impetrado pela Federação das Comunidades Quilombolas do Estado de Minas Gerais. “Primeiro, o documento com os impactos ambientais não foi apresentado pela empresa. Segundo, as comunidades diretamente envolvidas não estão sendo ouvidas no processo. E, para piorar, no site do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), os direitos minerários ainda estão em nome da Anglo”, afirma o advogado da federação, Matheus de Mendonça Gonçalves Leite.

Nessa quarta-feira (16), moradores de comunidades que seriam afetadas pela mineração da área foram até a prefeitura pedir apoio. Um dos receios da população é com relação ao abastecimento hídrico. “A região onde a empresa pretende minerar é área de recarga hídrica da Bacia do Peixe, que é o principal rio que abastece a cidade”, afirma a coordenadora estadual do Movimento pela Soberania Popular da Mineração, Juliana Deprá.

Nas proximidades de onde o projeto seria implantado, existe a comunidade quilombola Queimadas, com 60 famílias, que também temem pelos impactos. “Nós temos medo de faltar água para gente e como vai ser viver ao lado de uma mineradora usando dinamite para minerar do nosso lado”, disse uma das quilombolas que não quis ser identificada.

Histórico. Em 2015, o Codema negou um projeto apresentado pela Anglo American. Então, em 2018, a empresa vendeu os direitos minerários para a Herculano, que agora tenta novamente, com mudanças no empreendimento, aval para minerar no local. O conselho tem que avaliar se o projeto está em conformidade com o plano diretor da cidade. Caso não seja dado esse aval, mesmo que o governo do Estado licencie o empreendimento, a exploração não acontece.

O diretor executivo da mineradora, Marco Aurélio Fonseca Herculano Antunes, garante que o projeto é seguro. “Não vai haver supressão de nascentes nem rebaixamento de lençol freático e nenhuma desapropriação. Estão partindo do pressuposto de que somos testa de ferro da Anglo e que queremos emplacar o mesmo projeto, mas não é. Vamos provar isso para a juíza”, garante.
O prefeito da cidade, Guilherme Simões Neves, disse à reportagem que a ação do Codema é legítima e que ele vai garantir que todos os impactados sejam ouvidos pelos conselheiros antes da votação. A Anglo foi procurada, mas não se manifestou.


Entenda

Projeto: Lavra de minério de ferro a céu aberto

Produção: 500 mil toneladas de minério de ferro por ano

Investimento: R$ 85,133 milhões

Intervenções previstas: supressão de vegetação, construção de estradas de o, abertura de cava, perfuração de poços para suprir demanda estimada de 830 metros cúbicos de água por dia.

Outubro de 2015: O Codema deliberou por unanimidade pela inconformidade do empreendimento. Um dos principais motivos é o risco de impactar sobre área de recarga hídrica do rio do Peixe, que abastece o município.

19/12 de 2018: Na última reunião do Codema do ano, a discussão estava na pauta, mas teve que sair por causa de manifestações populares.

16/1 de 2019: Manifestação de moradores na porta da prefeitura contra o empreendimento.

7/1 de 2019: A Federação das Comunidades Quilombolas do Estado de Minas Gerais entrou com mandado de segurança coletivo contra o empreendimento.

14/1 de 2019: Justiça acatou pedido com liminar exigindo apresentação de mais documentos por parte da empresa e que uma comunidade quilombola que está nas proximidades seja ouvida.

16/1 de 2019: Manifestação de moradores na porta da prefeitura contra o empreendimento.

Minientrevista

Marco Aurélio Herculano
Diretor executivo da Herculano Mineração


Quais os detalhes do projeto?

O investimento, por enquanto, é sigiloso. A primeira fase seria de dez anos, mas a reserva tem potencial para estender por mais de dez anos. Trata-se de um projeto de mineração cujo licenciamento é mais simples. Precisamos de licenças prévias, de instalação e de operação. Vamos explorar 1,5 milhão de toneladas por ano de minério de ferro e gerar 250 empregos diretos.

Por que o direito minerário ainda está no nome da Anglo American?

Compramos 19 direitos minerários da Anglo em várias cidades. De todos eles, só esse não teve o nome transferido porque já é concessão de lavra. E, nesse caso, a transferência a pelo Ministério de Minas e Energia e está em formalização. Por não ser no Estado, é um pouco mais demorado. Mas temos como comprovar a compra com o contrato que assinamos.

Há um receio de impactos negativos para a comunidade quilombola Queimadas. Existe esse risco?

A comunidade é autodenominada quilombola, mas ainda não tem formalização. E por mais que seja quilombola, não está nem na área diretamente afetada, nem na indiretamente. Ela fica a 5 km do empreendimento. Então, não existe nenhum impacto na vida deles, a não ser morar a 5 km de uma mineração.